segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Sensacionalismo: a culpa é de quem mesmo?

Artigo escrito para aula de Produção I, sob docência do professor Deivison Campos.

Há no texto “Newsmaking: critérios de importância e noticiabilidade” um aspecto paradoxal que merece reflexão para o aperfeiçoamento do fazer jornalístico. Entre os principais critérios avaliados e presentes em qualquer decisão que defina o âmbito de uma cobertura noticiosa de determinado veículo está o seu processo produtivo. A transformação do acontecimento em notícia precisa ser uma produção contínua, necessária para suprir e abastecer o produto (jornal ou programa de rádio e TV). Essa continuidade precisa ser articulada sob a premissa da rotinização e estandarização das práticas produtivas:

“Sem certa rotina que podem servir-se para fazer frente aos fatos imprevistos, as organizações jornalísticas, como empresas racionais, falhariam” (Tuchaman, 1973, 160).

Se “a notícia é produto de um processo organizado que implica uma perspectiva prática dos acontecimentos (...) e fazê-lo de modo a entreter os espectadores” (Altheide, 1976, 112), constatamos que o pragmatismo reza pela factibilidade.

Muniz-Sodré ainda alerta que no tratamento da informação em televisão há uma clara desconsideração do contexto histórico, retirando o fato de seu meio, recortando um enfoque da realidade, também sob a égide do processo produtivo.

Por outro lado, reza a atual cartilha jornalística que os veículos de comunicação são empresas e necessitam ser viáveis financeiramente para manter sua independência editorial. Ser rentável significa ter bons índices de audiência. E conquistar audiência é um jogo pesado.

Temos percebido uma escalada sensacionalista nos meios de comunicação, em especial na televisão. Programas policiais se escondem sob a premissa do jornalismo para explorar a tragédia, sem qualquer preocupação na problematização do contexto social onde se desenrolam as histórias narradas em telejornais que poderiam ser ancorados diretamente de uma delegacia.

Questionados sobre a qualidade destes produtos, seus idealizadores transferem a responsabilidade ao público: segundo eles, a audiência tem o direito e o poder de decidir através do controle remoto, o que deseja assistir.

Eis aqui o paradoxo ao qual me referia: se a opção pela factualidade e o determinismo pela descontextualização histórica da notícia são deliberações do próprio meio de comunicação e da atual prática jornalística, como pode ser o público responsabilizado ao ser atraído por este formato, emoldurado sob artífices mais ligados à ficção do que a realidade?

“Naturalmente, um dos princípios fundamentais do jornalismo, é que, quanto maior, mais insólito ou mais sangrento é um espetáculo, maior é o valor-notícia. E isto, não é porque os jornalistas sejam macabros ou menos sensíveis às coisas belas da vida. Isso reflete apenas o fato de que o público se interessará mais por uma história que impressione, e pelo contrário, ignorarão uma notícia de rotina” (Brucker, 1973, 175, citado por Golding – Elliot, 1979).

Entendo a partir destas considerações que a noticiabilidade das tragédias e o fazer jornalístico singularizante são características complementares e indissociáveis do mesmo problema, mesmo sabendo que a superficialidade não é característica exclusiva das más notícias.

Mas vale questionar se uma mudança editorial, que voltasse às atenções a um jornalismo construtivo, que circundasse a notícia (mesmo que negativa) não poderia mudar essa cultura.

Esbarramos então nas premissas citadas anteriormente (brevidade ao repassar a informação, factibilidade e factualidade, não por acaso as principais características da crônica policial.

Podemos concluir que esse modo de fazer notícias descoladas de seu contexto e focadas singularmente no seu aspecto mais negativo não é responsabilidade APENAS do público, mas também de quem a produz, uma vez que não contribui para alterar essa cultura e se vale da alienação resultante da simplificação dos acontecimentos.

Concluo que redações regidas pelo “Bad news is a good news” não têm estão em condições de responsabilizar exclusivamente seu público pelo sucesso do jornalismo baseado nesta prática. Se o jornalista coloca-se como protagonista das transformações sociais e puxa para si a responsabilidade de esclarecer e informar, as empresas jornalísticas sérias devem também assumir a responsabilidade por reeducar o público para um novo modo de apreciar e consumir informação. A simples atividade baseada na busca do preenchimento de espaços com o que ACONTECE, sem discutir os motivos que levaram até tal desfecho, é um atentado contra a própria liberdade da atividade tão duramente conquistada, e que certamente, não foi imaginada para estes fins.

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