quinta-feira, 23 de setembro de 2010

A indelével prova do amor

Ela chegou. Sempre chega.

Rompendo o cinza amargo do inverno; Adoçando com cores um novo ciclo.

O perfeito alinhamento do sol entre os hemisférios denota o equilíbrio encarnado pela primavera.

O equinócio marca mais do que um período. É o lado poético, feminino e sensível da natureza.

É a face humana e delicada do Criador.

Céus mais azuis; horizontes mais claros; pessoas mais felizes.

A existência em suas mais complexas e frágeis formas aguarda tímida e recolhida por esse dia.

Os animais fervem em hormônios ansiosos pelo acasalamento.

O calor derrete o distanciamento provocado pelos meses de frio.

O vento sopra mais quente; os pássaros cantam mais alto, o sol nasce mais disposto.

E o que dizer das flores?

Delicadamente preenchem nossos dias com uma beleza que só elas são capazes de proporcionar. Nos encaram por onde andamos e nos obrigam a sorrir.

Nada pedem em troca. Voluntariamente brotam vida afora, despretensiosamente invadem nosso cotidiano e são capazes de nos provocar os mais profundos sentimentos.

Flores. A prova inequívoca de que a humanidade foi criada para amar.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

A moça das duas tiaras

Era um ambiente surreal. As escadas não subiam nem desciam.

Nas paredes, espelhos que não refletiam. Mas eram espelhos.

Uma luz infiltrava por um mínimo orifício no teto e se refratava em diversos matizes de cores não nomeadas pela arte moderna.

Ao fundo, no canto de três lados, um banco de apenas um pé.

Sentada, ela escondia o rosto com as mãos e os cotovelos apoiados sobre os joelhos.

Vestia um vestido rosa que apenas escondia sua derrière.

A meia calça rosa era o acabamento delicado que protegia pernas torneadas esculpidas por anjos transviados, que se renderam ao fascínio venenoso da alma feminina.

Não sei por que ela estava lá.

Tampouco imagino como entrei ali.

Mas esse não era um questionamento pertinente naquele instante.

Estava preocupado em conhecer aquele rosto escondido, saber dos anseios daquela criatura tão misteriosa e tão bela.

Ela permaneceu com a face oculta.

Ansioso, corri o olhar até seus pés descalços eram exatamente como eu os desejava: pequenos, delicados.

Mas toda aquela aura doce contrastava com detalhes perturbadores, que denotavam toda inquietude de uma personalidade peculiar.

No braço esquerdo, uma tatuagem.

Na cabeça, duas tiaras.

Ela balbuciou palavras em outra língua que não compreendi.

Mais do que isso não vi.

Acordei.

Mas quero voltar a dormir, para ver o rosto dela e descobrir os outros mistérios que me seduziram. Irremediavelmente.